Teoria da História e Historiografia - 5 Verdade e objetividade na história

 

Introdução

A reflexão sobre a objetividade e subjetividade no conhecimento histórico constitui um aspecto crucial na disciplina histórica, moldando a forma como interpretamos o passado e nos relacionamos com ele. Desde os tempos dos iluministas até as correntes historiográficas do século XIX, a dualidade entre objetividade e subjetividade tem sido central nos debates históricos. Este embate entre perspectivas distintas, representadas pelo positivismo e pelo historicismo, levanta questões fundamentais sobre a natureza do conhecimento histórico e o papel do historiador na interpretação do passado.

1 Objetividade e subjetividade no conhecimento histórico

A compreensão da história é permeada pela dualidade entre objetividade e subjetividade. Desde os iluministas do século XVIII, a disciplina histórica tem sido questionada em relação à sua produção de conhecimento e organização epistemológica. Enquanto o paradigma iluminista buscava uma história universal orientada pelo progresso, os historiadores contemporâneos reconhecem a diversidade das trajetórias sociais. A objetividade na história é debatida, sendo entendida como um conhecimento que, embora provenha do objeto, contém inevitavelmente elementos subjetivos.

Verdade e Objetividade na História

A dicotomia entre sujeito e objeto na pesquisa histórica não é simplesmente ativa-passiva; ambos estão intrinsecamente ligados, pois o objeto histórico possui uma materialidade própria. A subjetividade está presente tanto no historiador quanto nas fontes históricas, que foram produzidas em contextos específicos. O historiador deve reconhecer suas limitações, incluindo seu contexto temporal e social, para produzir interpretações verdadeiras sobre o passado, embora reconheça a relatividade dessas interpretações. A subjetividade não desqualifica a história como disciplina científica, mas é parte integrante do processo interpretativo.

Descartes e a Dúvida na História

A visão de René Descartes sobre o conhecimento verdadeiro desafiou a relevância da história como ciência. Ele argumentava que apenas a matemática proporcionava objetividade, enquanto a história era uma narrativa construída pelos historiadores. A objetividade na história é, portanto, uma questão complexa, envolvendo não apenas o método e a teoria, mas também a compreensão das limitações inerentes à condição humana, tornando-se essencial para a qualidade do trabalho historiográfico.

2 Os paradigmas positivista e historicista

No século XIX, o positivismo e o historicismo surgiram como importantes correntes historiográficas, deixando um legado perceptível nas discussões contemporâneas sobre história. Embora pareçam tradições equivalentes, essas correntes divergem em aspectos cruciais. A dicotomia entre objetividade/subjetividade, o método mais apropriado para a história (seja baseado nas Ciências Naturais ou em padrões específicos das ciências humanas) e a postura do historiador em relação ao conhecimento produzido são pontos fundamentais de discordância.

Positivismo:

No contexto da sociedade burguesa industrializada do século XIX, o positivismo francês, influenciado pelo Iluminismo, surgiu como uma corrente marcada pelo ideal de progresso e ordem. Augusto Comte, um proeminente pensador positivista, enfatizava a existência de leis gerais e invariáveis que governam as sociedades humanas. Sob essa perspectiva, a história seria tratada como uma ciência objetiva, guiada por métodos semelhantes aos das ciências naturais e mantendo a neutralidade do historiador em relação ao seu objeto de estudo.

Historicismo:

O historicismo, tanto na Alemanha quanto em outros países europeus e americanos, também surgiu no cenário de formação dos Estados Nacionais no século XIX. Representado por figuras como Johan Gustav Droysen e Leopold von Ranke, o historicismo alemão se baseava na interpretação contextualizada das fontes primárias e nas reflexões sobre a posição da história no campo científico. Os historicistas, fortemente influenciados pelo Romantismo, enfatizavam a importância da experiência e do contexto histórico na compreensão do passado. Suas contribuições foram essenciais para a autonomia da história como disciplina científica.

3 Paradigmas antagônicos sob viés comparativo

A história testemunhou uma alternância de modelos em relação ao papel do historiador e sua influência sobre o objeto de estudo, resultando nas correntes do positivismo e do historicismo. O positivismo, influenciado pelo Iluminismo, buscava a objetividade como meta. Seu foco era o "homem universal". Em contraste, o historicismo não negava as relações, inclusive afetivas, entre o pesquisador e seu objeto de estudo. Reconhecia que os indivíduos concretos eram moldados por contextos históricos específicos, dos quais não podiam se separar.

Essas correntes históricas geraram debates sobre o papel do historiador e sua neutralidade. Enquanto o historicismo era relativista, o positivismo buscava a objetividade. Na teoria do conhecimento, o positivismo defendia que a história tinha a função de explicar fenômenos históricos e sociais, enquanto os historicistas, com uma perspectiva objetiva, procuravam compreendê-los. A dicotomia entre explicação e compreensão reflete as divergências nas abordagens dessas correntes em relação ao objeto estudado e ao papel do historiador no processo histórico.

Apesar de cientes de que a objetividade completa não é possível, os historiadores procuram minimizar subjetividades, tanto do pesquisador quanto dos materiais que utilizam. A subjetividade é inerente ao conhecimento científico, mas isso não invalida a disciplina histórica. Historiadores como Bloch e Le Goff reconhecem a presença de subjetividade na pesquisa histórica, mas ressaltam a importância do compromisso ético do historiador para entender e ultrapassar as limitações do fazer historiográfico.

Conclusão

O embate entre objetividade e subjetividade no conhecimento histórico continua a desafiar historiadores, impulsionando a disciplina a evoluir e se adaptar. Embora a busca pela objetividade completa seja complexa e muitas vezes inatingível, a consciência da subjetividade no processo histórico enriquece a narrativa histórica, proporcionando uma compreensão mais profunda e matizada do passado. Historicistas contemporâneos, ao reconhecerem as limitações inerentes à sua prática, comprometem-se com uma abordagem ética, explorando as complexidades do passado de maneiras que respeitam a diversidade das trajetórias sociais e individuais. Nesse diálogo constante entre objetividade e subjetividade, a história como disciplina científica continua a prosperar, oferecendo insights valiosos sobre a complexidade da experiência humana ao longo do tempo.

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